segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

À espera de um milagre

A história de um padre andarilho e suas marcas deixadas na Região

Parte 6

Seguindo por um caminho desconhecido e longo, passo por rios e atravesso pontes, lá fora a cidade movimentada se transforma em mata fechada, salvo por algumas ruas e casas que aparecem de vez em quando. Para chegar até a única Paróquia do Beato José de Anchieta na Região, fundada em 1994 vou até a Área Continental de São Vicente, no bairro do Humaitá.

Novamente me deparo diante da paróquia, com uma escultura de Anchieta, com a onça aos seus pés e o índio ao seu lado, representando a época e a terra selvagem onde os missionários trabalhavam. À espera do pároco, sigo para a igreja vazia, tomada pelo silêncio profundo e pela luz fraca que entra pelas janelas. A construção é simples, mas a delicadeza do altar feito em mosaico de azulejos pequenos dá o toque único e original ao local.

Padre Aloísio Antônio da Silva me recebe já com um material separado, afinal não é a primeira vez que querem fazer uma reportagem sobre o assunto. Assim, acabo recebendo de presente um livreto criado em comemoração aos 25 anos da beatificação de Padre José de Anchieta, o título é interessante: O Padre Anchieta está à sua espera! Mas, depois de conversar com o pároco percebo que na verdade, todos estão à espera de um milagre, até mesmo Anchieta.

“Estamos rezando sempre com todos os fiéis para que mais um milagre seja alcançado e seja reconhecido pela Igreja, para que assim o nosso beato se torne santo”, conta Padre Aloísio. Com fiéis da própria comunidade, a Paróquia realiza novenas e eventos no bairro como uma forma de divulgar a santidade do jesuíta, já que a parte mais conhecida de Anchieta está voltada à cultura, ao turismo e à história.

Há dez anos comandando a Paróquia, Padre Aloísio acredita que o processo de canonização do jesuíta está sendo feito, mas encontra muita dificuldade, já que a obra de evangelização veio para o Brasil com a cruz e a espada.

Houve muitas mortes de índios e guerras numa época completamente selvagem, com missionários e conquistadores trabalhando juntos. “O problema é que perguntam ao Anchieta: você estava no meio de tudo isso e o que fez? Por causa disso, a obra dos jesuítas é tão criticada e a santificação de Anchieta vista tão negativamente”, explica o pároco.

Entre pausas e reflexões, Padre Aloísio confessa que muitos missionários superiores à Anchieta tinham uma visão dominadora e ambiciosa, mas lembra que com o passar do tempo ele acabou rompendo com essa ordem, indo viver entre os índios durante muito tempo, para que assim pudesse continuar sua missão.

Para a pequena igreja e sua comunidade, Padre Anchieta já é considerado um santo, e em passos lentos e discretos tenta buscar uma visibilidade maior para o beato, espalhando o processo de canonização aos quatro ventos e rezando para que os pedidos sejam atendidos.

Só mais uma pedra

A história de um padre andarilho e suas marcas deixadas na Região


Parte 5

Uma notícia velha de um jornal local em sua versão online, uma pequena nota sem foto me chamou a atenção. A matéria era de janeiro de 2006 e uma pedra fundamental tinha sido inaugurada em um terreno na Vila Mirim, Praia Grande, local onde se tornaria em quatro anos um grande Santuário ao Padre Anchieta.

Quatro anos depois nos levaria exatamente a 2010 e onde estaria o Santuário?

Não precisei de grandes esforços para encontrar o projeto “Caminhos de Anchieta” de autoria da AGEM (Agência Metropolitana da Baixada Santista), da CANAN (Associação Pró-canonização de Anchieta), do CONDESB (Conselho de Desenvolvimento da Baixada Santista) e da Secretaria de Estado de Turismo.

Logo no início do documento é apresentado o objetivo do projeto que procura resgatar o turismo religioso na Região, contribuindo para o processo de canonização do Padre Anchieta, possibilitando o desenvolvimento social e econômico, com a geração de empregos.

O Santuário em Praia Grande seria o ponto central de rotas de peregrinação em todo o litoral paulista, refazendo os passos da vida e obra de Anchieta por meio de atrativos históricos, naturais ou construídos. No local ainda seria criado um Centro de Estudos, reunindo todas as obras sobre o assunto.
Abandonado, mas oficialmente adiado o “Caminhos de Anchieta” foi vítima da burocracia e da falta de envolvimento em questões metropolitanas. É o que deixou claro a arquiteta e diretora técnica III da AGEM, Tamara Gakiya, “o projeto do santuário ficou parado depois da mudança da diretoria, houve um conflito de interesses. Para que ele seja reativado é preciso o envolvimento de muito mais gente, não somente da Agência, como também da Secretaria de Turismo do Estado e da Prefeitura de Praia Grande”.
Mesmo que alguns tenham desistido, outros ainda seguem acompanhando o assunto. Tamara acrescenta que a AGEM ainda vem participando de reuniões promovidas pela Associação Pró-canonização de Anchieta (CANAN), com sede em São Paulo, mas não sabe dizer em que pé estão as discussões.
O projeto era fantástico e talvez perfeito de mais, afinal, quando a esmola é demais o santo desconfia. Por enquanto, a pedra fundamental inaugurada se tornou só mais uma em meio ao mato do terreno esquecido.