domingo, 15 de maio de 2011

"Qual o seu mundo Chico Xavier?"

Com esta pergunta, o repórter José Hamilton Ribeiro começa a matéria, capa da edição de novembro de 1971 da extinta revista Realidade, com 16 páginas, várias fotos e pesquisas relacionadas ao espiritismo e aos estudos da atividade cerebral de Francisco Cândido Xavier.

O repórter e editor, Hamilton Ribeiro fez mais do que apurar dados e garantir a veracidade das informações passadas na reportagem, mais do que uma entrevista e uma matéria cheia de aspas. Ele esteve em Minas Gerais, acompanhou as sessões e esperou horas para conversar com Chico e conseguir sua mensagem psicografada. Hamilton Ribeiro fez parte da história, se tornou um personagem e sem sua vivência seria impossível descrever com a riqueza de detalhes, que faz com que o leitor se transporte até Uberaba, a Meca do espiritismo.


Vanessa Candia, em seu texto Antropocentrismo literário, explica que estes tipos de narrativas são inspiradas pela técnica norte-americana new journalism, e que o trabalho do jornalista era participar da vida do personagem, de maneira que o próprio repórter se tornava parte da história.

O próprio Hamilton Ribeiro, ganhador de três prêmios Esso, um dos pioneiros e que mais tarde também faria uma tentativa de reerguer a revista Realidade, como conta o texto de Candia, viveu na pele o new journalism enquanto cobria a Guerra do Vietnã. Sua matéria de maio de 1968, "Estive na Guerra" descreveu todo o seu sofrimento e a recuperação de parte da perna esquerda, perdida num acidente com uma mina terrestre.

Mas não é preciso tanto para usar a técnica que mistura jornalismo e literatura, afinal as revistas acolhiam bem estas narrativas. A importância da Realidade se deu, entre muitas outras coisas, pela presença de "um esforço de individuação textual, um franco exercício criativo com postura aderente a procedimentos de criação literária", como descreve Marcelo Bulhões, em Jornalismo e Literatura em Convergência. Certamente, em cada texto, o tom íntimo e único de cada repórter deixava-se transparecer, afinal cada vivência é única e cada percepção de um fato, local ou pessoa é íntima.

Não foi somente a escrita, que foi importada dos Estados Unidos, mas também os apelos visuais na diagramação de revistas e jornais tornaram a fotografia, presença marcante nas reportagens. Este, aliás, era o ponto forte da Realidade, que com fotos grandes reforçavam ainda mais o tema.

Na reportagem sobre Chico Xavier, as fotos fazem toda a diferença, a foto maior estampada na capa e outra muito parecida usada na abertura da matéria dão ao leitor a primeira impressão do personagem: a sua concentração. Porém, nas páginas seguintes aparecem a humildade, o humor, a simplicidade e a caridade, que se tornam claras através das fotografias e também do texto, o ti Chico (termo usado em Minas e na matéria), passa essa sensação.

No entanto, há no texto um elemento que do começo ao fim prende a atenção e desperta a curiosidade do leitor, o próprio repórter faz dois pedidos para pessoas distintas e os coloca entre os seiscentos pedidos do dia. A curiosidade do repórter, sobre a mensagem psicografada passa a ser a curiosidade do leitor.Este elemento do texto só é sanado no fim da reportagem, quando deixa claro que tudo é uma questão de fé.

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