domingo, 15 de maio de 2011

Pegadas na Areia

A história de um padre andarilho e suas marcas deixadas na Região

Parte 1

Sentada no chão da biblioteca e perdida em meio a livros de páginas amareladas e cheirando a mofo, busco informações soltas em cartas ou documentos, que se tornam peças de um quebra-cabeça histórico. Cada peça encontrada, completa o trajeto percorrido de um deles, a partir de pegadas deixadas através dos séculos, é o desafio encarado.

Atravessar várias cidades em um mesmo dia, já não é nenhum novidade para quem mora em Peruíbe, trabalha em São Vicente e estuda em Santos. Ver a Região pela janela de um ônibus ou de um carro, cruzando uma rodovia asfaltada e duplicada tem lá suas vantagens. Porém, fazer o mesmo caminho, a pé dentro de uma mata fechada e selvagem, é outra história. Talvez, a história de um padre.

Em meio à selva, os pés velozes e descalços do jovem jesuíta, nascido a 19 de março de 1534, em Tenerife, uma das Ilhas Canárias dominadas pela Espanha, percorreram o litoral brasileiro, espalhando os ensinamentos cristãos e absorvendo a cultura indígena. José de Anchieta abriu seu próprio caminho no meio da mata, subindo a muralha que conhecemos como a Serra do Mar.


O padre, considerado precursor da cultura brasileira, ensinou por meio do teatro e da poesia, índios e portugueses, além de aprender a medicina dos nativos. Para produzir sua obra que sobrevive até hoje, Anchieta escolheu o espanhol, o português e o tupi.

Os pés do padre, do mestre e do padre, deixaram marcas por onde passou. Entre os sertões de Itanhaém e as serras de Paranapiacaba, o jesuíta construiu colégios, converteu nativos, ajudou a fundar as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, e a criar o que definimos por Costa da Mata Atlântica. Seu caminho é eternizado pelos monumentos que foram erguidos para lembrar sua passagem e influência na Região.

Seu trabalho foi admirado por alguns escritores, que acabaram se tornando biógrafos de sua vida, como o professor, conferencista e historiador Padre Hélio Abranches Vioti. Em sua obra descreve que a vida de Anchieta foi vivida "em favor da elevação intelectual, moral e religiosa". Outro escritor católico, o Padre Armando Cardoso, autor do livro "O Bem-Aventurado Anchieta", considera que o padre "tornou-se o símbolo da educação cristã e continua a ser um estímulo para todos os que trabalham na formação da juventude."

Não foram apenas padres que prestaram homenagem à Anchieta, contemporâneos ou históricos escritores não se abstiveram de reverenciar a obra e o personagem histórico. O conhecido escritor e jornalista Euclides da Cunha escreveu: "(A Companhia de Jesus) Ligou à humanidade, emergente da agitação fecunda da Idade Média, um povo inteiro - espíritos jungidos a um fetichismo deprimente, forças perdidas nas correrias guerreiras dos sertões...E para esta empresa imensa teve entre nós uma alma simples, sem violentos ímpetos de heroicidade - amplíssima e casta - iluminada pela irradiação serena do ideal."

Mais próximo do nosso tempo, Cecília Meireles criou um poema contando a história do padre jesuíta, o trecho mostra o envolvimento e comprometimento de Anchieta com os fundamentos cristãos. "Vede Anchietá, o santo, / a tratar de chagas, / a enxugar o pranto/ do índio sofredor, a aprender-lhe o idioma, / a ensinar-lhe amor."

A admiração não é somente sobre o que Padre Anchieta fez, mas principalmente como fez. Como um professor talentoso buscou novas formas de ensinar e cativar seu público? O historiador e sociólogo, Nelson Werneck Sodré escreve que o jesuíta preferiu descer à praça e conquistar um público mais amplo para transmitir seus ensinamentos. E lá ele permanece até hoje.


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